Audiência de custódia completa dois anos de implementação no dia 24 de fevereiro e gerou mudanças na situação do encarceramento, mas ainda precisa ser aperfeiçoada
Implementada em 2015 por iniciativa do CNJ – Conselho Nacional de Justiça em parceria com o TJ – Tribunal de Justiça, a audiência de custódia completa dois anos no dia 24 de fevereiro. A medida estabelecida em diversos documentos* de Direitos Humanos prevê que a pessoa acusada se apresente a um juiz ou uma juíza em até 24 horas do momento da prisão em flagrante. Nesta audiência são ouvidas a pessoa acusada, a defensoria pública, o advogado ou a advogada e o Ministério Público.
Com a proposta de redução das prisões provisórias e o combate e prevenção à violência policial, a audiência de custódia é um meio de verificar quais foram as condições em que se deram a prisão em flagrante, identificando padrões de violência e seletividade criminal nas abordagens policiais.
A medida já foi aplicada em todos os Estados brasileiros e estuda-se a possibilidade de ampliação a diversas cidades e também a realização de audiências no período de recesso de juízes e juízas. Isso porque, apesar dos números indicarem a diminuição do encarceramento, pessoas que foram presas durante períodos em que não havia atividade no judiciário, como o recesso ou até aos finais de semana, não obtiveram o direito à audiência de custódia.
A pesquisa do IDDD – Instituto de Defesa do Direito de Defesa apresenta o perfil socioeconômico dos presos que é em sua maioria homens, negros, faixa etária de 18 a 24 anos, com apenas o ensino fundamental completo e renda entre 1 e 2 salários mínimo.
Durante o ano de 2016, o levantamento realizado pelo CNJ apontou que das 153,4 mil audiências ocorridas 70,8 mil resultaram em liberdade, o que corresponde a 46,17% das pessoas acusadas.
Ainda assim, em alguns estados a apuração de dados demonstrou que em metade dos casos julgados a prisão cautelar é aplicada, porém os levantamentos são de períodos distintos e não há dados concretos do mesmo caráter anteriores à implementação da audiência de custódia. O que torna difícil uma visão mais ampla de mudança.
Os casos de violência ainda permanecem negligenciados pelos juízes, juízas e pelo Ministério Público no momento da audiência. No estudo lançado recentemente pela Conectas Direitos Humanos, Tortura Blindada: Como as instituições do sistema de Justiça perpetuam a violência nas audiências de custódia, são apresentados os dados sobre os casos de tortura e o questionamento sobre o procedimento policial.
Segundo André Augusto Salvador Bezerra, da AJD – Associação de Juízes pela Democracia, para que a medida siga com efetividade é necessário o olhar atento ao sistema jurídico, que cada vez mais, adota uma linha punitivista.
Para Mariana Lins, pesquisadora do ITTC, as audiências têm o papel de garantir direitos durante o processo de julgamento, “a possibilidade de contar a sua versão [da pessoa indiciada] do ocorrido precisa estar associada a uma postura dos agentes públicos de respeito e consideração da palavra da pessoa, rompendo com uma desconfiança inicial. A forma como a audiência de custódia é conduzida exerce um papel fundamental para concretizar (ou não) suas finalidades”.
O ITTC é uma das organizações que lutou pela implementação audiência de custódia e vem acompanhando sua efetividade. Neste sentido, o que foi observado é que a postura do judiciário em relação encarceramento permanece a mesma, perpetuando a decisão de recorrer à prisão antes de a pessoa ingressar na sala de audiência.
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*Sobre a finalidade e os documentos que citam a apresentação da pessoa acusada dentro de um período mais breve possível, ver texto do Justificando.
Saiba mais:
ITTC EXPLICA: o que são audiências de custódia?
Audiência de Custódia: “É possível processar e prender alguém respeitando os Direitos Humanos?”