Remição de pena por meio da educação popular

Roda de conversa sobre remição de pena integrou a 4ª edição da Semana de Formação em Direitos Humanos e Educação Popular, promovida pela Ação Educativa. Debate trouxe ações realizadas em São Paulo e refletiu sobre seu alcance nas unidades prisionais

Por Gabriela Menezes e Isabela Shigunov

O evento “Remição Penal: Educação popular nas prisões” ocorreu no dia 17 de julho e foi composto por uma roda de conversa seguida por um debate na sede da Ação Educativa.  Tendo em vista a efetivação do direito à educação de pessoas em privação de liberdade, o evento visou trocar experiências entre grupos que realizam atividades de educação popular no cárcere, bem como discutir os desafios para a remição de pena por meio de tais atividades e pensar em formas de atuação conjunta para a efetivação e ampliação desse direito.

A roda de conversa contou com a participação das organizações do Grupo de Trabalho Educação nas Prisões,  composto pela Ação Educativa, pelo Núcleo de Situação Carcerária da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, pela Pastoral Carcerária, pela Conectas, pela UNIFESP, pela Coletivo Libertas e pelo ITTC. Também participaram do evento grupos que trabalham com remição penal pela leitura ou exercem outras atividades de educação popular nas prisões, além da presença de educadores, pesquisadores, estudantes e funcionários do DEPEN e da FUNAP.

A remição de pena através do estudo formal é um direito garantido pela lei nº 12.433 de 2011. Já em 2013, o Conselho Nacional de Justiça publica a Recomendação nº 44, que dispõe sobre atividades complementares de estudo para a remição da pena, principalmente através da leitura. Atualmente, são remidos 4 dias de pena para cada livro lido, havendo o limite de leitura de 12 livros por ano para fins de remição.

A experiência dos grupos de remição pela leitura nas prisões revela que as dinâmicas dessa atividade podem variar de acordo com as unidades prisionais. Geralmente, criam-se clubes ou rodas para a leitura e discussão das obras. Em alguns locais os livros são estabelecidos previamente, enquanto outros permitem que o grupo responsável pela atividade faça a seleção do acervo. O produto dessa atividade costuma ser apresentado em formato de resenha, que é avaliada por pareceristas, e em caso de aprovação devem ser encaminhadas para o juiz de execução para o cálculo da remição.

Dentre os desafios para a continuidade e ampliação de projetos desse tipo, os grupos citaram: ausência de financiamento, dificuldade para arrecadação de livros, critérios para avaliação das resenhas – que podem variar substancialmente de acordo com as portarias estabelecidas por cada juiz – e a própria resenha enquanto produto da atividade de leitura, o que dificulta a aprovação de pessoas pouco ou não alfabetizadas.

Além disso, os participantes também levantaram a importância de outras formas de atividades de educação popular que sejam consideradas para a remição penal, como atividades culturais e esportivas, que já estão previstas na recomendação do CNJ citada anteriormente. A incorporação dessas atividades é importante pois por meio delas é possível incorporar grupos que tendem a ser excluídos das rodas e clubes de leitura – como analfabetos e pessoas estrangeiras – , já que para este grupo a língua pode ser a principal barreira para sua inserção em atividades de remição de pena por meio do estudo ou da leitura.

Ações de remição de pena em perspectiva

Na segunda parte da atividade foi realizado um debate para aprofundar a discussão dos temas levantados na roda de conversa. A mesa teve como mediadora Cláudia Bandeira, pedagoga e assessora da área de educação na Ação Educativa;os debatedores Zé Leme, integrante da FUNAP e supervisor da unidade prisional feminina de Tremembé; e Sara Vieira Antunes, antropóloga e integrante da Pastoral Carcerária.

Zé Leme iniciou o debate apresentando um breve panorama histórico sobre a inserção de uma educação popular e cidadã dentro das prisões, sobretudo no Estado de São Paulo. Em sua fala ressaltou a necessidade de um Plano Estadual que incorpore essa demanda de forma mais institucionalizada, pois este tipo de ensino dentro do sistema prisional ainda apresenta características muito abrangentes com poucas diretrizes e normas.

Posto isso, Leme encerrou sua fala enfatizando a necessidade de priorizar a universalização desses projetos a fim de alcançar toda população prisional do Estado de São Paulo, inclusive através de alternativas que também atendam a população analfabeta e falantes de outros idiomas.

A fala de Sara, que se deu em sequência, começou com algumas reflexões a respeito do sistema prisional. A antropóloga aponta para a necessidade de se pensar alternativas ao encarceramento, como a remição através da educação, mas afirma que deve-se tomar cuidado ao tentar humanizar demais as prisões, pois a partir disso abre-se espaço para que as cadeias continuem existindo em massa, uma vez que humanizadas e naturalizadas teriam argumentos positivos para a continuação de sua existência. Ou seja, é preciso pensar a educação nas prisões como um objetivo político de diminuir cada vez mais a população carcerária para que a lógica do encarceramento em massa seja quebrada.

Para finalizar, Sara retomou algumas das dificuldades encontradas ao longo do processo de remição por educação, sobretudo através da leitura. Chamou atenção para a falta de transparência frente aos dados disponibilizados pelo sistema carcerário e apontou para a dificuldade criada pela falta de diretrizes e portarias que regulamentem como será feito esse tipo de remição.


Foto: Bárbara Alves | Ação Educativa (2019)

 

 

 

 

Compartilhe

jul 24, 2019 | Noticias | 0 Comentários

Posts relacionados