Diante do cenário de pandemia global do COVID-19, o Instituto Terra, Trabalho e Cidadania – ITTC exige que o Estado brasileiro tome medidas emergenciais de desencarceramento em relação às pessoas em situação de privação de liberdade. Isso porque o sistema prisional constitui uma ferramenta sistemática de violações de direitos fundamentais que caracteriza “um estado de coisas inconstitucional”. Dessa forma, o ambiente do cárcere se torna propício para o agravamento exponencial do quadro de crise e disseminação desenfreada do coronavírus.
Atualmente, o Brasil tem a terceira maior população carcerária do mundo. São mais de 750 mil pessoas vivendo em condições precárias e expostas a doenças como tuberculose, HIV, pneumonia, doenças de pele, entre outras. São Paulo concentra cerca de 33,1% de presas e presos desse total. Com o agravamento para estado de pandemia do coronavírus, a falta de acesso a materiais de higiene pessoal, assistência médica e suporte adequado de medicamentos, o racionamento de água e a alimentação de baixo valor nutricional se colocam como obstáculos para cumprir com as medidas de prevenção básica da doença.
É urgente que medidas que contenham a propagação do vírus no sistema prisional sejam tomadas pelo poder público, visto a superlotação dos hospitais e das unidades básicas de saúde, bem como a insuficiência do Sistema Único de Saúde (SUS) para suportar tal demanda. O ITTC, em sua atuação, sempre defendeu e promoveu a aplicação de medidas desencarceradoras e vê como imprescindível, neste contexto, o cumprimento do que já é garantido por lei.
Cita-se, à título de exemplo, a Lei do Marco Legal da Primeira Infância, promulgada em 2016, que altera o código de processo penal brasileiro a fim de garantir a substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar de mulheres mães de crianças com até 12 anos, gestantes, lactantes ou homens que sejam os únicos responsáveis pelos cuidados de filho/a com até 12 anos. Também, a lei 12.403/2011 garante o mesmo para pessoa imprescindível aos cuidados de menores de 6 anos ou com deficiência, para maiores de 80 anos ou pessoas debilitadas por doenças graves.
Assim, entendemos que são medidas possíveis e devem ser priorizadas: a substituição de penas privativas de liberdade por restritivas de direitos e da prisão preventiva por outras medidas cautelares; a prisão domiciliar; e a suspensão de prisões que não por decisão transitada em julgado. Também, é necessário que os responsáveis pela gestão dos presídios e unidades socioeducativas efetivem ações clínico-epidemiológicas preventivas, se antecipem a um surto dentro do cárcere que de forma implacável atingirá a população privada de liberdade e os trabalhadores que atuam nessas áreas.
Diante do exposto, em nome da saúde pública e da priorização da vida, o ITTC reivindica medidas desencarceradoras imediatas para:
- Mulheres mães de crianças com até 12 anos, gestantes, lactantes, assim como de todas as pessoas que preenchem os requisitos previstos na Lei do Marco Legal da Primeira Infância/2016;
- Mulheres migrantes;
- Pessoas com mais de 60 anos;
- Pessoas soropositivas para HIV, portadoras de tuberculose, câncer, pneumonia, diabéticos, hipertensos, entre outras doenças preexistentes;
- Pessoas acusadas de crimes não violentos, incluindo tráfico de drogas,
Por fim, o ITTC apoia as medidas tomadas em alguns estados, como Minas Gerais, Pernambuco e Bahia, no sentido de reduzir a população carcerária como forma de evitar o alastramento do coronavírus. Na mesma linha, o Conselho Nacional de Justiça se posicionou por meio da Resolução 62 de 2020, de 16 de março, recomendando que os Tribunais e magistrados adotem medidas preventivas nos sistemas de justiça penal e socioeducativo, de modo a impedir o impacto devastador do coronavírus no sistema prisional.