ITTC Explica: O que é o Marco Legal da Primeira Infância?

O encarceramento feminino no Brasil cresceu 656% em 16 anos. Segundo os dados do Infopen Mulheres (2018), a maioria das mulheres em estabelecimentos prisionais atualmente responde por crimes praticados sem violência, sendo o tráfico de drogas o mais recorrente, responsável pela prisão de 62% dessas mulheres. Quase metade dessas mulheres está presa provisoriamente, ou seja, ainda não possui condenação.

Além do tipo de crime e do fato de serem alvo de um uso excessivo de prisões provisórias, há um fator comum entre as mulheres selecionadas pelo sistema penal: 74% são mães. 

Além disso, são pobres, negras, jovens e moradoras das periferias. Assim, fica claro que essas mulheres pertencem a grupos sociais marcados pela vulnerabilidade socioeconômica, sofrendo uma série de privações, dificuldades e violências em seu cotidiano, que se intensificam com a prisão. 

Todos esses elementos são reforçados por especificidades de gênero como a maternidade. A sociedade racista e machista em que vivemos impõe às mulheres a responsabilidade pelos cuidados domésticos e de filhos/as ou outras pessoas, como idosas. 

Quando uma mulher é presa, toda sua família é impactada

Com a crescente atenção dada a esse tema, em 8 de março de 2016 foi promulgada a Lei nº. 13.257. Conhecida como Marco Legal da Primeira Infância, essa nova legislação alterou Código de Processo Penal, ampliando as hipóteses de prisão domiciliar cautelar para mulheres gestantes, mães de crianças com até 12 anos ou responsáveis por pessoas portadoras de deficiência.

Ao possibilitar essa alternativa à prisão preventiva, a lei tem por objetivo garantir a proteção integral à criança – pois a pena determinada à sua mãe não deve se estender a ela – e, principalmente, ao pleno exercício da maternidade.

Em 20 de fevereiro de 2018, a aplicação do Marco Legal foi reforçada por determinação do Supremo Tribunal Federal (STF) na ordem de habeas corpus coletivo nº 143.641. 

Essa decisão, embora tenha determinado a concessão da prisão domiciliar para todas as mulheres nas condições estabelecidas pelo Marco Legal, foi mais restritiva que a lei e estabeleceu 3 hipóteses em que a alternativa não pode ser aplicada: 

  1. Se o crime for cometido contra descendentes
  2.  Se o crime for cometido com violência ou grave ameaça
  3.  Em caso de “situações excepcionalíssimas”, sem determinar quais seriam.

Essa novas condições, principalmente as “situações excepcionalíssimas”, deram margem a diversas arbitrariedades e discricionariedade na aplicação da Lei pelo poder judiciário. Diante disso, em 19 dezembro de 2018, a Lei 13.769 incorporou alguns pontos da decisão do STF, visando harmonizar as decisões judiciais, e estabelecendo critérios objetivos ao Código de Processo Penal para a substituição da prisão preventiva por prisão albergue domiciliar.

O Instituto Terra, Trabalho e Cidadania – ITTC, que há mais de 20 anos desenvolve um trabalho junto às mulheres em conflito com a lei comemorou a promulgação da normativa por conta de seu potencial desencarcerador. Com efeito, o ITTC participou ativamente da mobilização para garantir sua concretização. 

Assim, acreditando que a incidência política deve estar sempre combinada com o estudo das dinâmicas da realidade social, surgiu a pesquisa Diagnóstico da aplicação do Marco Legal da Primeira Infância para o desencarceramento de mulheres, que busca compreender de que maneira os atores do sistema de justiça criminal têm operado essa nova regulamentação. 

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out 1, 2019 | Artigos, Noticias | 0 Comentários

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