“Se estamos onde estamos é porque não queremos que outras mulheres passem pelo que passamos”
A fala de Teodora del Carmen, representante do Mujeres Libres El Salvador, demonstra que a luta pelo desencarceramento vem, principalmente, da força coletiva: das mulheres que estão privadas de liberdade, pelas que passaram pelo cárcere e daquelas que ainda enfrentarão esse processo.
“no más prision para las mujeres” (Foto: Gabriela Güllich/ITTC)
A taxa de encarceramento feminino no Brasil subiu de forma exponencial desde 2006, chegando em 2018 a 700% de crescimento. Contando com 179 Unidades Prisionais, o estado de São Paulo possui uma das maiores taxas de encarceramento do país. Em 2019, na capital paulista, as prisões em flagrante respondem pela maioria das prisões realizadas (78% do total). Ela configura uma das três espécies de prisão provisória – além da temporária e a preventiva – existentes na legislação, isto é, prisões que acontecem antes do julgamento. Mas ao contrário das outras modalidades de prisão provisória, a prisão em flagrante independe de investigação prévia e mandado judicial. Isso significa que, no ano de 2018, ¾ das mulheres que estavam encarceradas foram privadas de liberdade antes mesmo do julgamento.
Prisão perpétua é a sentença que condena por um crime uma pessoa pelo resto de sua vida natural. Assim como muitos outros países, a Constituição brasileira determina que não haverá penas de caráter perpétuo no país. Mas o que se percebe é que existe uma contradição entre a garantia fundamental prevista e a realidade do encarceramento.
Embora o processo penal e a prisão cessem depois de um tempo determinado, marcas como o estigma de ter passado pelo sistema, a rejeição e violência dirigida a essas pessoas, a vulnerabilização desses grupos sociais que são selecionados pelo sistema penal e os inúmeros direitos básicos a quais são privados se estendem ao longo da vida e ultrapassam a pessoa condenada pelo crime, atingindo famílias, pessoas queridas e comunidades inteiras: outra contradição entre garantias legais e a dura realidade do cárcere.
“Viver dentro da prisão é viver sem direitos humanos. Existe muita desigualdade, então cada vivência é única e tem sua história” Betty, representante do Mujeres Unidas por la Libertad do México.
Pensando no peso dessa Pena Perpétua, o III Encuentro de Mujeres Libertarias Fundiendo Rejas lança virtualmente, no dia 18 de março, das 17h às 18h (horário de Brasília a campanha “Não Mais Penas Perpétuas”, em alusão à necessidade de reconhecer que existe um processo de punição e criminalização contínua de pessoas que passaram pelo sistema prisional e suas famílias e a necessidade de romper esses ciclos.
ENCONTRO LATIONAMERICANO DE MULHERES SOBREVIVENTES DO CÁRCERE NO BRASIL
A Red de Mujeres Libertarias Fundiendo Rejas é uma articulação de organizações, grupos e mulheres que passaram pela prisão e familiares de diferentes países da América Latina. No mês de março, ocorreu o Encontro do Comitê da Rede Latinoamericana de Mulheres Sobreviventes do Cárcere e Familiares, representada no Brasil pelo ITTC e pela Amparar, contando com a participação de mulheres do Brasil, Chile, Colômbia, El Salvador e México.
Encontro da Rede Lationamericana de Mulheres Sobreviventes do Cárcere na DPE (Foto: Gabriela Güllich/ITTC)
Encontro da Rede Lationamericana de Mulheres Sobreviventes do Cárcere na DPE (Foto: Gabriela Güllich/ITTC)
Durante esse encontro, foram trabalhados pontos de alinhamento internos e planejamento anual de trabalho da Rede e da Campanha a ser lançada. As representantes também trocaram relatos a respeito das experiências mais marcantes que passaram dentro da prisão e como essas recordações podem servir para gerar propostas de políticas públicas e de transformação social. A Rede também visitou a sede da Defensoria Pública do Estado, onde o defensor público Mateus Moro, um dos coordenadores do Núcleo de Situação Carcerária, explicou como é a atuação da DPE na defesa dos direitos de pessoas privadas de liberdade no estado de São Paulo.