ITTC Explica: Tráfico Privilegiado – o que muda com a decisão do STF?

Tráfico privilegiado o que muda com a decisão do stf

Apesar da causa de diminuição do parágrafo 4º da Lei 11.343/06 permitir chamar o tráfico praticado por pessoas primárias e sem ligação com organizações criminosas de privilegiado, como a Lei 8072/92 equiparou o crime de tráfico a hediondo, o tráfico privilegiado também era assim considerado.

O fato de um crime ser considerado hediondo nada mais é do que um nome que se dá a um crime que o legislador ou a legisladora pretende considerar mais grave, e que engloba condutas bastante distintas entre si como estupro e falsificação de produto medicinal. Quando uma pessoa é condenada ou presa por um crime hediondo, ela sofre a restrição de alguns direitos: não poderá pagar uma fiança, não terá anistia, graça ou indulto, e a progressão de regime na execução penal funciona de forma diferente.

Ainda, mesmo que sem previsão legal, a suposta hediondez do crime fazia com que muitos juízes e muitas juízas, a seu critério, deixassem de aplicar a pena restritiva de direitos. Por exemplo, quando foi promulgada, a Lei de Drogas vedava expressamente penas restritivas para o tráfico. No entanto, esse assunto foi pacificado pelo Supremo Tribunal Federal em 2013, quando reconheceu a repercussão geral no julgamento do Agravo em Recurso Extraordinário 663261, declarando inconstitucional essa proibição.

Recentemente, o Supremo Tribunal Federal decidiu no Habeas Corpus 118.533 que o legislador não desejou incluir o tráfico privilegiado entre os crimes hediondos e que o fazer seria desproporcional. Com isso, foi definitivamente superado o argumento de que não caberia a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, e a pessoa que for condenada por tráfico privilegiado não se submete mais a um regime diferente na execução penal. Isso significa ter direito a terminar o cumprimento de sua pena fora do regime fechado mais rápido.

Antes, às pessoas primárias era necessário cumprir ⅖ da pena para progredir de regime, e às pessoas reincidentes, ⅗. O livramento condicional era vedado às reincidentes em crimes hediondos, e às primárias era necessário cumprir ⅔ da pena. Agora, os lapsos dos crimes comuns serão aplicados para quem estiver cumprindo pena por tráfico privilegiado. Assim, ao cumprir ⅙ de sua pena a pessoa presa poderá progredir de regime. O livramento condicional passa a ser aplicado às pessoas reincidentes, ao cumprirem ½ da pena, e às primárias ao cumprirem ⅓.

Além disso, torna-se mais fácil a aplicação do indulto ao crime de tráfico privilegiado. Ainda que os últimos decretos presidenciais já concedessem indulto a este crime, juízes e juízas se negavam a concedê-lo com base na argumentação de que era um crime hediondo.

Tendo em vista que 64% das mulheres está presa por tráfico de drogas (Infopen, 2014), esse regime mais pesado que era aplicado aos crimes hediondos terá impacto significativo no seu desencarceramento, pois terão efetivados direitos como o indulto, o livramento condicional e a progressão de regime mais cedo.

O ITTC tem lutado pela concessão do indulto a mulheres presas por tráfico de drogas junto ao Grupo de Estudos e Trabalho “Mulheres Encarceradas”, já que esse é o motivo de mais da metade das condenações. Além disso, o ITTC entende que é preciso rever a política de drogas adotada pelo Brasil, já que ela afeta mulheres de maneira mais danosa. Exemplo disso é a discrepância na concessão dos indultos. Em 2014, enquanto 2 335 homens receberam o benefício, apenas 65 mulheres se enquadraram nos requisitos.

Entenda como será, na prática, a mudança do entendimento do tráfico privilegiado como crime não hediondo no próximo texto.

Leia também:

ITTC Explica: O que é tráfico privilegiado?

Queria que não tivesse nenhuma mulher no sistema penitenciário

* Esse texto faz parte da série ITTC Explica, que busca explicar conceitos e esclarecer dúvidas relacionadas aos temas trabalhados pelo ITTC. O tema do próximo artigo da série é “Tráfico privilegiado – como aplicar?

Compartilhe

nov 14, 2016 | Artigos | 0 Comentários

Posts relacionados