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É urgente enfrentar a prática do encarceramento sistemático no Brasil. Esse foi o tema que o ITTC abordou durante entrevista à rádio CBN, no dia 30 de novembro. Raquel da Cruz Lima, coordenadora de pesquisa do programa Justiça Sem Muros, expôs alguns dos diagnósticos e propostas que serão desenvolvidos ao longo do projeto de pesquisa “Alternativas ao Encarceramento”, cujo lançamento ocorreu em 3 de dezembro.
O ponto de partida desse projeto é o reconhecimento de que a forma de funcionamento da nossa justiça criminal deve ser repensada. Durante o último ano, foram vários os episódios que demonstraram que violência e violações de direitos humanos são os principais resultados que o sistema prisional pode gerar. Casos como o de Pedrinhas, no Maranhão, revelam que a superlotação dos complexos penitenciários e as condições degradantes de sobrevivência a que os detidos ficam sujeitos têm como grande consequência o fortalecimento das chamadas “facções criminosas”.
A demanda da população por mais segurança é uma das principais forças que, de um lado, incentivam a criação de leis penais mais duras e, de outro, movem a atuação da polícia, promotores e juízes no sentido de prender – e manter presas – cada vez mais pessoas. Mas se é fato que essa é uma demanda legítima da sociedade, é igualmente verdade que a prisão é uma medida totalmente incapaz de trazer mais segurança e que, pelo contrário, propicia o agravamento da violência urbana, frequentemente vinculada à atuação das facções.
Assim, quando se fala que no Brasil há um aumento desenfreado na quantidade de pessoas presas, o que se tem em vista são, sobretudo, os diversos problemas sociais e a violência que necessariamente decorrem de uma sociedade que prende muito. Essa é uma questão que tem sido reconhecida em todo o mundo e debatida por grandes organizações internacionais como a ONU e a OEA, e que no Brasil assume feições dramáticas na medida em que o ritmo com que a população carcerária cresce aqui é o segundo maior de todo mundo e a quantidade de pessoas presas, a terceira maior, conforme dados do CNJ.
É nesse contexto em que se discutem as alternativas ao encarceramento, isto é, respostas aos conflitos sociais que não se confundam com o aprisionamento. Hoje na nossa legislação já estão previstas algumas alternativas, como a restrição de direitos, a prestação pecuniária e a prestação de serviços à comunidade, e desde 2000 o Ministério da Justiça tem incentivado a criação de estruturas para que elas sejam aplicadas. Mesmo tendo crescido o número de pessoas que recebem as alternativas penais, o ritmo de crescimento da população presa não dá sinais de arrefecer, demonstrando que enfrentar a atual política de encarceramento exige alterações mais profundas na nossa justiça criminal. Nossos desafios não são meramente de infraestrutura ou gestão, mas são do próprio modelo de justiça criminal, que desconsidera qualquer especificidade do caso concreto e mede a todos e tudo a partir da pena de prisão.
A pesquisa “Alternativas ao Encarceramento” nasce com a missão de ajudar a compreender a gravidade do atual cenário da prisão no Brasil e contribuir com o debate sobre como podemos responder melhor aos conflitos sociais que existem. É fundamental superar mitos e preconceitos e aceitar que nosso modelo de justiça criminal precisa ser completamente revisto, em especial para não atribuir à prisão a tarefa – impossível de ela cumprir – de reduzir a violência em nossa sociedade.