Prisão provisória é utilizada de forma excessiva e acentua encarceramento em massa

A restrição de liberdade até o julgamento é um ato recorrente, essa medida aumenta o número de pessoas presas provisórias e a superpopulação carcerária

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No início de fevereiro, a inauguração do Centro de Detenção Provisória (CDP) Marcos Amilton Raysaro, no interior de São Paulo, contou com evento presenciado pelo governador do Estado de São Paulo Geraldo Alckmin e o Secretário de Administração Penitenciária Lourival Gomes, além de divulgação e transmissão ao vivo na página da Secretaria de Administração Penitenciária (SAP).

As informações divulgadas pela SAP citavam a infraestrutura diferenciada do prédio, que possui sistema automatizado para as portas da cela, além de espaços para estudo, setores de trabalho, saúde e lavanderia, garantindo o acesso a direitos básicos. Apesar do avanço, a preocupação em proporcionar o acesso a estes espaços para uma pessoa em prisão provisória evidencia como as políticas de segurança estão focadas no encarceramento.

Atualmente, as medidas de segurança, atreladas a outras políticas, como a de drogas e o sistema judiciário, são utilizadas de maneira a viabilizar o encarceramento como pena única e exclusiva para o combate à violência urbana. O investimento na construção de novos complexos penitenciários e a adoção da privatização dos presídios evidenciam esse cenário.

A prisão provisória é uma medida recomendada em casos excepcionais. Ainda assim, cerca de 40% da população carcerária é de pessoas presas provisoriamente. Enquanto estão aguardando o julgamento, as pessoas nessa situação costumam permanecer em um CDP por um tempo excedente ao da pena aplicada posteriormente.

Modificações contrariadas

A utilização da prisão como forma de garantir que a pessoa acusada esteja atrelada ao processo tem se tornado uma regra no poder judiciário. Em 2011, o Código de Processo Penal (CPP) sofreu modificações quanto às regras de prisão. As novas recomendações incluem mudanças na prisão provisória, preventiva e temporária.

Anteriormente, as únicas previsões legais possíveis eram o relaxamento da prisão ilegal, a fiança, a liberdade provisória e a prisão preventiva. Com a mudança no CPP, agora são prescritas uma série de medidas cautelares que propõem alternativas à prisão, como o comparecimento mensal em juízo.

Mesmo com outras medidas que preveem a redução do encarceramento, como as audiências de custódia, no estudo Liberdade em Foco realizado pelo Instituto de Defesa ao Direito de Defesa (IDDD), dos casos analisados de prisão em flagrante, 94,8% resultaram em prisão provisória. Atualmente, o Brasil excede a população carcerária em mais de 50%, o que se equipara ao número de pessoas em prisão provisória, cerca de 250 mil.

Recorrer ao encarceramento é uma prática que faz parte do cotidiano judiciário, segundo Nina Cappello, pesquisadora do programa Justiça Sem Muros do ITTC. “Ainda que a gente tenha previsões legais que, a princípio, seriam para reduzir o encarceramento, essas previsões, na verdade, ou não são utilizadas ou  são apenas utilizadas para incrementar o encarceramento, para aumentar o poder punitivo”, afirma.

Seletividade criminal

Na pesquisa do IDDD, entre os casos analisados, o perfil colhido é de pessoas negras (66%), jovens (cerca de 57% têm entre 18 e 24 anos), com baixa escolaridade  e sem antecedentes criminais (58,3%).

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Abrir a discussão para a sociedade sobre os impactos do encarceramento tanto para o indivíduo, que sai da prisão estigmatizado com dificuldades de conseguir emprego, como no coletivo pode atuar para encontrar outras formas de resolver conflitos.  

De acordo com Nina Cappello, o que se percebe com a ação do poder judiciário é uma cultura do encarceramento que acentua a aplicação de políticas penais na população em vulnerabilidade social. Para ela, é necessário pensar em mudanças para além da lei, que não tem se mostrado suficiente.

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mar 21, 2017 | Artigos, Noticias | 0 Comentários

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