O jogo “Política de Drogas é uma Questão de Mulheres” foi criado pelo Programa Gênero e Drogas com o objetivo de ser um material lúdico e dinâmico para fomentar espaços de reflexão e servir de instrumento na formação e sensibilização de profissionais e gestores de políticas públicas, de organizações da sociedade civil e de pessoas que desejam se aprofundar nos diferentes temas que se interligam com a política de drogas.
As histórias de Maria, Teresa, Fanny, Vitória e Júlia, em suas especificidades, representam muitas mulheres de todo o Brasil e nos convidam a embarcar em experiências de vida, refletindo sobre os diferentes temas que se entrelaçam com a política de drogas e criam contextos em que, no lugar das personagens, devemos escolher os próximos passos. Será que as escolhas só dependem de nós?
O jogo, desenvolvido entre 2018 e 2021, encontrou na pandemia novos contextos. Traçamos rotas inéditas para possibilitar a experiência do jogo on-line, embarcamos em algumas histórias com grupos de diferentes lugares do Brasil, descobrindo a multiplicidade de Marias, Teresas, Fannys, Vitórias e Júlias que viviam situações muito singulares criadas pela dinâmica da pandemia de covid-19.
Nesse período, realizamos debates, em conjunto com as demais equipes do ITTC, nos estados de Mato Grosso do Sul, Pernambuco e Roraima. Serviços da assistência social e da saúde, organizações da sociedade civil, instituições de ensino e grupos de estudo, movimentos e redes antirracistas e feministas de todas as regiões do Brasil receberam o jogo físico e jogaram on-line conosco. Trocas sobre como funcionam as políticas de assistência psicossocial em diferentes estados e sobre a existência ou não de redes locais enriqueceram o diálogo e possibilitaram pensar avanços em prol do cuidado e do atendimento de mulheres cis, trans e travestis.
Com a redução dos casos de covid-19 e entendendo a importância de encontros presenciais, no final de 2021 e durante o ano de 2022, passamos a nos encontrar pessoalmente com serviços, redes, movimentos e grupos para jogar o jogo. Na experiência com grupos de profissionais de serviços, o jogo convida a uma nova dinâmica para as equipes. A partir da leitura em conjunto da história de alguma personagem, o debate sobre os temas trazidos ou até mesmo os assuntos que se relacionam pela experiência do próprio serviço começam a ser suscitados e colocados em movimento.
Discussões sobre como a identidade racial, a classe social, o gênero e outros marcadores da personagem afetam as experiências dos diversos participantes do jogo, assim como a reflexão sobre qual é a realidade mais recorrente das pessoas atendidas pelo serviço são levantadas pelos trabalhadores nos grupos. Percebemos que, rememorando alguns casos e pensando na história da personagem escolhida pelo grupo, surgem insights sobre como, a partir do próprio serviço, há condições para que, através da personagem, as usuárias do serviço possam ter acesso e informação sobre escolhas mais benéficas a longo prazo para si e, ainda, conseguimos visualizar os profissionais refletindo sobre formas diferentes de encarar ou ofertar seus serviços.
Até o momento, tivemos a oportunidade de formar grupos que atuam diretamente com o público, especialmente, adultos, mulheres, usuárias(os)(es) de álcool e outras drogas e crianças e adolescentes, nos âmbitos de atuação da sociedade civil – educação popular e assessoria jurídica popular –, escola, serviço de assistência e serviço de saúde mental, todos localizados em regiões distintas e de periferia, em São Paulo, tais como: Campo Limpo e Jd. São Luís, ambos na zona sul; Sapopemba, Cidade Líder e Itaquera, todos na zona leste.
Nesses espaços, as peculiaridades de cada serviço e localidade, os desafios nos atendimentos diretos, além da interlocução com outros atores da sociedade, também foram marcos nas discussões e reflexões fomentadas pelo jogo, em conjunto com as(os) participantes. As trocas e o compartilhamento de experiências trouxeram grande riqueza às reflexões, a partir das memórias de cada pessoa que tem contato com o jogo.
A experiência do jogo em grupos de conversa com mulheres nos mostra outras potências. As discussões levantadas sobre cada carta e qual escolha fazer revelam um processo de muitas mulheres em rever suas próprias vidas, suas escolhas quando mais novas e qual é a ideia atual sobre o que deveriam ter feito. Com o exercício de olhar para as características de cada personagem e para as situações que estavam vivenciando, pudemos notar também um grande movimento de empatia, tanto para a história jogada no jogo quanto às próprias experiências que iam sendo gradualmente revividas.
De um lado, o jogo nos guia a pensar as multiplicidades e reconhecer histórias que se repetem em todo o Brasil, como “meninas” que se veem responsáveis pelo cuidado dos irmãos, que têm pais violentos, adolescentes que são expulsas de casa por conta de sua identidade de gênero, entre muitas outras histórias. Do outro, nos leva a fazer o exercício de reconhecer as experiências próprias de cada personagem, aquilo que é único, ímpar, cada traço que compõe sua vida, as possibilidades que aparecem ou deixam de ser viáveis, quais cuidados são necessários e como pensá-los a partir das ferramentas disponíveis para cada serviço, grupo, comunidade.
Na prática, o jogo alcança um campo muito maior do que seu próprio nome sugere. “Política de Drogas é uma Questão de Mulheres” vai além de pensar os efeitos mais diretos da atual política de drogas na vida de mulheres cis, trans e travestis; ele propõe um espaço dinâmico para a reflexão sobre a multiplicidade de experiências de mulheres em relação à política de drogas, bem como instiga o pensamento sobre algumas subjetividades relatadas pelas histórias das personagens e pelas histórias das pessoas que estão jogando o jogo.
O jogo está disponível para impressão em nosso site e, para convidar a equipe do Programa Gênero e Drogas para atividades envolvendo a dinâmica, basta entrar em contato através do email generoedrogas@ittc.org.br.