[Projeto Estrangeiras] – Perfil

Perfil – Presas Estrangeiras

Às sextas feiras, seguimos publicando histórias que nos foram escritas/relatadas por mulheres que vivem em situação de Cárcere no país.

Conheça uma Mexicana acompanhada pelo Projeto Estrangeiras.

*Os nomes dos perfis serão trocados, ou omitidos, por motivos de segurança.

gravida_040511_mahaliestackpole.creativecommons“Um dia, em uma cidade do México, uma suposta amiga me convidou para fazer uma viagem à Bolívia, que correu tudo bem, e ao final viajei da Bolívia ao Brasil. Estive três dias em São Paulo e no sábado saí com destino ao aeroporto para voar à Holanda, viagem que nunca chegou ao fim, primeiro por causa do meu passaporte, que teriam descoberto que era falso – o que era mentira, porque sou mexicana. Depois, ao me revistarem, encontraram a droga e eu não acreditava que estava vivendo isso. Ao fim, passei sábado à noite e domingo na Delegacia e um uma segunda-feira, em dezembro de 2009, cheguei à PFC (Penitenciária Feminina da Capital). Eu tinha medo quando entrei de que tratassem mal ou me batessem. Quando entrei, vi o portão, ajudaram-me a subir até a minha cela, todas me contaram seus casos e eu me senti mais tranquila porque conheci pessoas agradáveis.

Depois que passou o dia mais amargo da minha vida, quando deu a hora da tranca, às seis horas da tarde, quando aqui se finaliza o dia (nunca imaginei que um dia minhas atividades se encerrariam por causa da hora), começou este desespero de ter que olhar quatro paredes e aprender a conviver com gente que nunca vi, que não são do meu país, que não têm a mesma cultura, nem a mesma educação que eu (e isto é super difícil), até esperar cair de sono e cansaço, porque no primeiro dia chorei e chorei muito…E ter que esperar por tudo em fila: para comer, para tomar banho, para tudo…

Ainda em dezembro, eu estava preocupada porque minha menstruação não vinha. Fizeram-me um exame de urina e, ah, minha surpresa: grávida. Senti felicidade e tristeza, um conjunto de sentimentos que se encontraram, porque eu não tinha planejado uma gravidez e muito menos estando presa.

Depois de tudo, não ficou mais fácil porque eu não recebia visitas, nem ajuda de ninguém. Cheguei sem nada, só com roupas e algumas coisas de higiene. Onde eu vivia, disseram-me de tudo. Quando comecei a trabalhar depois de três meses presa, comprei aquilo de que necessitava, mas em questão de comida, que eu não comia porque o prato de plástico me dava asco e eu não queria comer, sofri muito porque tinha vontade de comer outros tipos de coisas e tinha desejos… Eu pensava que quando estivesse grávida teria uma dieta saudável e boa para meu bebê e para mim. Chorava pedindo a Deus que protegesse meu bebê para que nascesse saudável. Apesar das circunstâncias, só pedia por isso, pelo meu bebê.

Seguia trabalhando e depois de uns três meses e pouco fui ao Fórum. A Polícia Federal me levou e eu fui com muito medo porque dirigiam feito loucos. Depois, o juiz me escutou, expliquei tudo, não menti em nada, disse tudo como foi. E, bom, ele me sentenciou primeiro a 6 anos e 3 meses, e, por ser primária, reduziu para 5 anos e 3 meses (baixou um ano, que compreensivo! não!). Bom, então eu apelei com a Defensoria Pública porque o promotor (Ministério Público) apelou para subir a pena. Até aí, tudo bem, depois começou a passar o tempo e eu trabalhando, e meu bebê crescendo dentro de mim. Aos 5 meses de gravidez, fui fazer um ultrassom para saber como estava e se era menino ou menina. Para minha surpresa, ela não deixou ver se era menino ou menina, apesar de todas me dizerem que era menina. Bom, isso não me inquietava, eu só queria saber se estava bem de saúde, e o doutor me disse que tudo estava bem e eu fiquei tranquila.

Depois, completei 9 meses. Trabalhei até o último dia da minha gestação, graças a Deus eu não sentia dores, tive uma gravidez maravilhosa. Depois, fui à ginecologista, e me mandaram direto para o Hospital, onde me levaram. Uff! Rápido, que eu estava morrendo de medo. Abaixei e me colocaram as algemas. Aí, pensei que fosse uma revista, e não errei. O médico me revistou e me internou. Colocaram uma sonda, onde iam colocar o soro. Cheguei às quatro da tarde, colocaram-me na sala de pré-parto com a algema no pé e, bom, quando colocaram o soro, puseram-me para dilatar para quem sabe ter um parto normal. Começaram as dores mais fortes e eu algemada, até que não suportei mais porque queria me sentar, encostar, e pedi à guarda que me tirasse as algemas. Ela o fez e, depois disso, começaram as contrações a cada 20 minutos, a cada 15, a cada 10, a cada 5…deixaram-me um tempo sozinha, eu me toquei e senti a cabeça do bebê. Gritei e chamei, fui ver a doutora. Como iam fazer uma cesárea, fui à sala de operação. Diziam-me para fechar as pernas, eu não aguentei, me deu uma dor de cabeça que sentia que eu ia morrer porque a hora do parto já estava se passando (pré-eclâmpsia) e bom, cortaram-me sem anestesia. Na verdade, por ser meu primeiro parto eu sofri muito. Quando vi minha filha, pensei que não havia maior sofrimento físico estando presa, este sentimento é pior, não dói nada mais que a alma. Ela nasceu com 3kg e 450g e 48 cm, nunca me esquecerei, e me colocaram em um quarto com algema em um dos pés.

 Depois disso, fiquei mais 6 dias porque minha filha nasceu com icterícia. Eu voltei e a deixei no hospital. Depois de 3 dias, trouxeram-na para mim. Eu fiquei muito preocupada e triste porque todo mundo me perguntava por ela. Depois que chegou, minha bebê estava perdendo peso, eu me assustei e as enfermeiras não davam atenção. Falei com a guarda que a bebê estava com desidratação e infecção de urina. Ela esteve uma semana sozinha no hospital. E não me ofereciam nada, eu perguntava e nem atenção me davam. Passei um inferno na ala de Saúde da Penitenciária. Quando deram duas semanas, transferiram-me para o Hospital Penitenciário (C.O.C). Lá foi mais ou menos, óbvio que eu tinha que me adaptar. O que me importava mais era aproveitar a minha bebê…

E chegou o dia em que a entreguei: em dezembro de 2010, minha mãe veio do México para buscá-la, e foram só duas visitas, nem pude conversar muito com ela. Depois, o dia foi de lágrimas, emoção, felicidade e tristeza. O que eu ia fazer sem a minha filha? Meu primeiro bebê sem família. Não desejo isso a ninguém, nem a meu pior inimigo.

De verdade, estar presa para mim tem sido um desafio de muitos ensinamentos bons e ruins, de aprendizagem, para crescer e ser uma pessoa melhor. Agora deixo o dia passar trabalhando, sem pensar muito na vida. Só penso em uma coisa, que é sair. A liberdade é o que de mais valioso tem o ser humano e é a única coisa que ninguém nunca imagina perder depois de ter tudo e ser muito feliz. Nunca se sabe o que te espera no dia de amanhã. Eu só dou graças a Deus e peço para que me dê saúde aqui e fora daqui”.

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jul 26, 2013 | Noticias | 0 Comentários

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