Segundo ConverSarau da campanha “Encarceramento em massa é justiça?” aborda as precariedades do sistema socioeducativo brasileiro

Por: Juliana Avila Gritti

A segunda roda de conversa e poesia da campanha “Encarceramento em massa é justiça?”, ocorrida no dia 25 de julho, tratou de um tema pouco discutido quando se fala em restrição de liberdade: adolescentes em conflito com a lei. O evento, sob mediação do poeta Rodrigo Ciríaco, procedeu à exibição da websérie documental “O Filho dos Outros”, lançada em 2017 pelo Coletivo Rebento para discutir a redução da maioridade penal.

Bruno Garibaldi, diretor da série e integrante do coletivo, iniciou a conversa relatando o processo de idealização e concretização do projeto. As filmagens começaram em 2015, no ápice da polêmica nacional sobre a redução da idade mínima para reclusão de adolescentes. A equipe audiovisual conseguiu adentrar uma unidade socioeducativa, a qual se encontrava caótica após uma rebelião. Depois de recolherem esse material, começaram a investigar a situação da família desses jovens. Bruno concluiu, a partir da sua experiência, que o funcionamento do sistema resulta numa “produção de indivíduos vulneráveis” que a sociedade insiste em ignorar.

Mariana Chies, coordenadora do Departamento de Infância e Juventude do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), apresentou dados sobre o sistema socioeducativo do país. A socióloga atentou para a imprecisão de informações disponíveis, consequência de uma catalogação ineficiente do Sistema Nacional Socioeducativo (SINASE), e declarou ser inadmissível a ocorrência de mortes de jovens adolescentes enquanto sob tutela do Estado, como aconteceu em Goiânia em maio deste ano.

Danielle Tsuchida, coordenadora de projetos do Instituto Sou da Paz, expressou receio em relação às possibilidades do sistema socioeducativo, administrado atualmente pelo Ministério dos Direitos Humanos, ser delegado para a Segurança Pública. A medida estaria em descompasso com o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) e recomendações internacionais, como as da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança. “O Executivo não garante direitos, mas é o primeiro a punir”, afirmou Danielle.

Rodrigo Ciríaco concluiu a parte expositiva do encontro declamando o poema Os Miseráveis, de Sérgio Vaz (Colecionador de Pedras, Global Editora, 2013):

Vítor nasceu
no Jardim das Margaridas.
Erva daninha,
nunca teve primavera.
Cresceu sem pai, sem mãe,
sem norte, sem seta.
Pés no chão,
nunca teve bicicleta.
Já Hugo, não nasceu, estreou.
Pele branquinha, nunca teve inverno.
Tinha pai, tinha mãe,
caderno e fada madrinha.
Vítor virou ladrão, Hugo salafrário.
Um roubava pro pão, o outro, pra reforçar o salário.
Um usava capuz, o outro, gravata.
Um roubava na luz, o outro, em noite de serenata.
Um vivia de cativeiro, o outro, de negócio.
Um não tinha amigo: parceiro.
O outro, tinha sócio.
Retrato falado, Vítor tinha a cara na notícia,
enquanto Hugo fazia pose pra revista.
O da pólvora apodrece penitente,
o da caneta 
enriquece impunemente.
A um, só resta virar crente,
o outro, é candidato a presidente.

 

Saiba mais:

http://ittc.org.br/livro-analisa-reducao-da-maioridade-penal-atraves-do-olhar-legislativo/

http://ittc.org.br/webserie-documental-o-filho-dos-outros-debate-a-reducao-da-maioridade-penal-no-brasil/

http://ittc.org.br/reducao-da-maioridade-penal-e-tema-de-audiencia-publica/

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ago 8, 2018 | Noticias | 0 Comentários

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