Evento de encerramento da celebração de 20 anos do ITTC apresenta balanço da luta pelo fim da revista vexatória

Com relatos de familiares de pessoas presas submetidas à prática, o debate mostrou as violações da revista vexatória

O encerramento do Ciclo de cinedebates ITTC 20 anos aconteceu na última quinta-feira, dia 9 de novembro, na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP). Com o tema “Revista vexatória – a violência contra familiares de pessoas presas”, o evento contou com os relatos de familiares e o lançamento do vídeo Familiares de pessoas presas: o que o município tem a ver com isso?, que faz parte das ações da Agenda Municipal para Justiça Municipal.

Na abertura do evento, Michael Mary Nolan, presidenta do ITTC, trouxe o contexto de fundação do ITTC e também um pequeno histórico da luta pelo fim da revista vexatória. A fala foi sucedida pelos agradecimentos do vice-presidente Guilherme Madi Rezende, pela presença do público e da mesa.

Raquel da Cruz Lima, pesquisadora do Programa Justiça Sem Muros, iniciou um bate-papo com Maria Helena da Silva Sartori e Juliana* sobre a experiência delas como visitantes de pessoas presas. A conversa abordou assuntos como o transporte até a unidade prisional, a preparação para a viagem e do jumbo e também as violações sofridas durante a revista vexatória.

“É muito constrangedor, é muito ruim em todos os aspectos”, comenta Juliana sobre a revista vexatória

Maria Helena começa a relatar sua experiência como visitante. Ela acompanhou o filho durante sua prisão em uma delegacia, em um CDP (Centro de Detenção Provisória) e em uma penitenciária e relatou as diferenças no processo de visita nos três locais. “Eu era leiga nesse assunto, mas tive que aprender em dois palitos”, conta Helena.

Quando o filho foi transferido para a penitenciária, outros processos, desde a preparação do jumbo até as questões com transporte, surgiram. Sobre isso, Juliana ressalta como visitar também gera impactos que afetam os familiares financeiramente. “É caro você pagar uma passagem de 400 reais, 200 reais na rodoviária que seria uma viagem realmente mais segura, mais confortável”, explica Juliana.

Entre as diversas vezes que teve que se submeter à revista para visitar o filho, Helena se lembra da primeira vez que levou a neta para visitá-lo com um misto de alívio e indignação. “Eu tinha vontade de levar a minha neta e nunca tive coragem de enfrentar aquilo ali. Porque ela tava saindo de um processo e eu ia judiar da menina. […] Quando eu saí de lá, pra minha felicidade, tinham suspendido a nudez”, conta Helena.

Raquel da Cruz Lima explica que a visita de Helena aconteceu no período da campanha engajada pela Rede Justiça Criminal: “Pelo fim da revista vexatória”. Nos dias 16 e 17 de agosto de 2014, nenhuma penitenciária do estado de São Paulo realizou a revista íntima. Isso ocorreu no fim de semana seguinte à aprovação da lei estadual que proíbe a revista vexatória. Porém, a suspensão da prática ocorreu apenas naqueles dias.

A realidade e a experiência de Juliana foram contrárias às de Helena. Ao levar a filha para visitar seu familiar, enquanto a criança passava pela revista, um dos aparelhos de detector de metais apitou. A situação deixou a criança desesperada, pois já tinha visto a tristeza da mãe ao ser suspensa.

Revista vexatória na história do ITTC

Raquel fechou o bate-papo traçando o histórico da atuação do ITTC, em especial do Programa Justiça Sem Muros, com a pauta da revista vexatória. “O que a gente faz pra evitar que isso não aconteça? Por mais que a gente fale muito sobre isso, a gente ainda não conseguiu mudar essa realidade. Mas a gente já conseguiu avançar muito no sentido de que ela possa não existir”, reflete a pesquisadora.

A perspectiva legislativa foi um dos primeiros caminhos a ser tomado para mudar o cenário e lutar pelo fim da revista vexatória, aponta Raquel. Em 2004, o ITTC e o GET –Mulheres Encarceradas provocaram o Ministério Público para que um inquérito civil fosse instaurado e investigasse a prática. Na época, poucas pessoas sabiam da existência de um processo que submetia crianças, mulheres e idosos à nudez e a posições humilhantes como condição para visitar seu familiar em situação de prisão.

“A atuação com revista vexatória nos ensina muito a atuar com direitos humanos”

Raquel da Cruz Lima, pesquisadora do Programa Justiça Sem Muros

O passo seguinte foi a consulta a outros países sobre a existência da revista vexatória. Descobriu-se, então, que muitos não adotavam a prática. Em 2011, o Comitê Internacional de Prevenção à Tortura apontou em seu relatório que a revista vexatória se equipara à tortura.

Nas diversas ações que ocorreram para estudar e investigar o porquê de a revista vexatória, continuar existindo enquanto prática institucional, Raquel aponta que as violações vão além da humilhação da prática. Muitas vezes, as mulheres que visitavam eram impedidas de ver a pessoa presa por normas internas de vestimenta ou por falhas técnicas, como aparelhos de detector de metais com problemas de funcionamento.

Para continuar a luta pelo fim da prática, a pesquisadora pontua que é necessário estar atento às alternativas à revista vexatória. A adoção de scanners e outros equipamentos representam uma conquista, mas não podem se tornar outro empecilho para a visita nem causar danos à saúde.

Veja a cobertura do evento na íntegra em vídeo e as fotos com os principais momentos na página do facebook do ITTC.


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nov 13, 2017 | Noticias | 0 Comentários

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